Por Alexandre Grandi
A colaboração entre os atores da cadeia de saúde pode se dar não só nos aspectos de governança e alianças, mas também pela conexão mais intrínseca com a tecnologia. Iniciativas de interoperabilidade e troca de dados devem criar a infraestrutura que viabilizaria a disponibilidade de dados clínicos — obviamente respeitando todos os requisitos de privacidade — para um público mais amplo. Isso proporcionaria melhor compreensão da saúde da população e consequentemente eficácia maior nos tratamentos e terapias.
Os investimentos feitos agora durante a pandemia com telessaúde, inteligência artificial e aprendizado de máquina (machine learning) estão gerando benefícios relevantes em termos de resultados para a saúde e para a melhoria da competitividade do setor. Os fabricantes de dispositivos médicos, por exemplo, podem usar sua força de trabalho que atuava 100% em campo para, a partir de agora, analisar remotamente como estão funcionando seus equipamentos instalados em hospitais, clínicas e laboratórios.
Essa mesma força de trabalho, via canais digitais, pode monitorar condições clínicas dos pacientes em home care (claro que com a devida permissão do paciente), como arritmias cardíacas. Pode também avisar o paciente que seu dispositivo está com baixo nível de energia ou predizer que está próximo de uma pane/parada em seu funcionamento – e assim disparar alerta às equipes de manutenção para uma intervenção preventiva a fim de não causar indisponibilidade do serviço que depende de tal dispositivo/equipamento.
A pandemia está direcionando os consumidores para os canais digitais de saúde, e o distanciamento social – imposto pela pandemia e recomendado pelas autoridades sanitárias dos governos de muitos países – exigiu que as organizações implementassem tecnologias digitais, como a telessaúde, para que houvesse continuidade no relacionamento com seus pacientes mesmo de forma remota. Para atender a essa demanda pelos canais digitais muitas organizações tiveram de redimensionar (ou por vezes criar do zero) suas centrais de atendimento ao paciente. Tais centrais tiveram de adicionar o profissional de saúde no menu de serviços, para as consultas médicas remotas, com alta disponibilidade (muitos, em 24×7).
A pandemia veio para acelerar a agenda de transformação digital que muitas organizações de saúde já tinham em andamento ou em planejamento. Agora é fundamental que tais planos e ações atendam não apenas às necessidades imediatas que profissionais de saúde, colaboradores, governos, órgãos de regulamentação, pacientes e familiares estão apresentando, mas também se preparem para as mudanças que ainda estão por vir como resultado no pós-pandemia.
Assistência médica virtual, ciência de dados e interoperabilidade digital podem ajudar o ecossistema de assistência médica a permanecer eficaz em uma pandemia. Somente por meio desses novos modelos é possível viabilizar engajamento, colaboração e interação remota e on-line de profissionais de saúde que estão a quilômetros de distância. Também se faz possível a análise de dados de pacientes e resultados laboratoriais que identifiquem profissionais de saúde com elevado número de pacientes de alto risco, e para esses gerar planos de cuidados mais adequados.
Outra possibilidade também é criar modelos analíticos regionalizados em tempo real para entender os impactos no uso de medicamentos e insumos hospitalares, como os EPIs para as equipes da linha de frente no tratamento da covid-19.
No pós-pandemia uma parcela acredito que relevante da demanda por serviços remotos permanecerá, mas provavelmente não sua totalidade, como é hoje em meio à pandemia. Portanto as empresas precisam estar preparadas para lidar com uma redução dessa demanda no futuro para não ficar com um custo operacional desnecessário depois. Seu modelo de operação deve estar pronto para lidar com essa elasticidade.
Por fim, olhando para um horizonte de médio prazo, a indústria farmacêutica terá condições de repensar as estratégias de lançamento de seus produtos ante as mudanças no mercado, modelo de negócios, regulamentações e expectativas dos consumidores que advierem da pandemia.
Alexandre Grandi é diretor para América Latina das Indústrias de Saúde e Ciências da Vida da Cognizant