* Por João Pedro Flecha de Lima
Numa das eleições mais acirradas de sua história, os norte-americanos escolherão quem vai governar a maior potência econômica e militar do planeta. Um dos temas centrais da disputa surgiu com a revelação pelo jornal “The New York Times” de que, pouco antes de assumir a Secretaria de Estado, em 2009, a candidata Hillary Clinton instalou um servidor particular em sua casa, em Nova York.
A então secretária teria usado esse servidor para suas trocas de e-mail, profissionais e pessoais, durante os quatro anos no cargo. Hillary não teria ativado a conta de e-mail “state.gov“, hospedada nos servidores de propriedade do governo dos Estado Unidos, e disse que sua preocupação em relação aos e-mails era “não correr o risco de que seus dados pessoais se tornassem acessíveis”. Hillary foi investigada pelo FBI, que analisou o teor de seus e-mails e julgou que era desnecessária a abertura de inquérito. Mas esse episódio gerou vários debates que revelaram que os norte-americanos se sentem espionados de maneira excessiva pelas as agências de segurança de seu país, como FBI, NSA e CIA.
Outro evento, de 2013, também se insere neste mesmo contexto. Na ocasião o ex-técnico segurança da CIA Edward Snowden foi acusado de espionagem por tornar públicas informações sigilosas de segurança dos Estados Unidos, e revelar com detalhes a existência de programas de vigilância que os norte-americanos utilizam para espionar seus cidadãos e outros países, dentre eles o Brasil. Snowden mostrou como servidores de portais de grande tráfego e acesso realizam a analise regular de dados, monitorando conversas de e-mail e de telefone. Na época do escândalo, mensagens e telefonemas da presidência da república do Brasil com seus principais assessores foram violados.
Quase a totalidade (>99%) do volume de dados, voz e imagens do planeta é transmitido através cabos submarinos, amplamente utilizados no mundo todo para este fim pois possibilitam transmitir uma imensa quantidade de informações à velocidade da luz, interconectando data centers, onde ficam armazenadas informações digitais que guardadas nas chamadas nuvens. Da mesma forma, por causa da topologia global dos cabos submarinos atualmente existentes, praticamente todos os dados (>99%) que entram ou saem do Brasil têm que passar pelos EUA, principalmente por um mega Data Center localizado em Miami que interconecta 160 operadoras globais e que, segundo analistas de telecom, tem 2 de seus 6 andares ostensivamente ocupados pela NSA.
O volume de dados da internet vem crescendo a taxas exponenciais e muitas empresas existem somente no ambiente virtual, em modelos rentáveis que se baseiam exclusivamente em plataformas web – a chamada “uberização” ou economia colaborativa chegou colocando em cheque os modelos de negócio existentes.
À medida que a conectividade de indivíduos, corporações e governos crescem, as preocupações com a segurança e a privacidade de dados deveriam estar cada vez mais presentes. Talvez já saibamos disso, mas não conhecemos a real dimensão da vulnerabilidade a que nossos dados estão expostos ao passar pelos EUA, conforme mostrado por Edward Snowden.
Por isso, iniciativas que ajudem a assegurar a privacidade dos cidadãos, empresas e governo brasileiro são fundamentais, mesmo sabendo que dado o caráter dinâmico e progressivo da Internet, não há como apontar os limites de acesso indesejável ao qual estamos sujeitos. A construção de um cabo submarino direto do Brasil para a Europa pode mitigar substancialmente o risco de violação da privacidade dos dados brasileiros.
Além de proteger os dados do País, a ligação direta com o continente europeu vai trazer muitos outros benefícios: A Europa é um hub natural já que reúne 7 dos 10 maiores Pontos de Troca de Tráfego (PTT – interconexão física entre dois ou mais provedores de Internet para troca de tráfego entre suas redes do mundo). E grande parte (>75%) do conteúdo acessado pela população brasileira na web também está disponível no continente europeu.
A construção de um cabo submarino de telecomunicações com tecnologia de ponta em fibra ótica para fazer a ligação direta entre Brasil e Europa, além de restabelecer nossa ligação histórica com o “velho continente” através de uma conexão de alta capacidade e baixa latência, ajudará a resguardar os direitos constitucionais de proteção da privacidade e da imagem de cidadãos, empresas e governos brasileiros.
* João Pedro Flecha de Lima é CEO da Cabos Brasil-Europa S.A.- EllaLink