América Latina, China e o desenvolvimento de aplicativos

*Rafael Lauand

Recentemente, tive a oportunidade de conhecer melhor o mercado de internet chinês, durante o evento World O2O Expo, em Pequim, na China. O que mais ouvi por lá foram questionamentos sobre as diferenças dos aplicativos chineses em relação aos latinos.

Do meu ponto de vista, a diferença entre os dois mercados é relativamente simples: os apps latinos são mais focados na usabilidade e na interface, enquanto os chineses se concentram em funcionalidades. O que isso significa? Significa que por aqui criamos aplicativos específicos para cada tipo de serviço: um para chamar táxi, outro para pedir comida, outro para mapas e geolocalização, para jogos, e assim por diante. Também temos muita preocupação com a interface. Ela deve ser simples e objetiva. Quanto mais fácil de usar, melhor. Já os chineses se preocupam mais com inovação e, como já dito, as funcionalidades dos apps. É comum eles terem uma espécie de marketplace de serviços dentro do aplicativo. Para ilustrar essas diferenças, vou usar os exemplos de dois apps de mensagens: o americano WhatsApp e o chinês WeChat.

Atualmente com 1 bilhão de usuários, o WhatsApp é um aplicativo que permite enviar e receber mensagens de texto, imagens, vídeos, documentos em PDF, Word, Excel e PowerPoint, além de fazer ligações grátis por meio de uma conexão com a internet. E segue a característica latina de possuir uma interface simples.

O WeChat, com aproximadamente 800 milhões de usuários, vai mais longe. Além de integrar diferentes meios de comunicação, como seu concorrente WhatsApp, ele possui dois diferenciais bem relevantes. Um é o sistema de localização junto ao recurso que deixa o usuário descobrir e conversar com quem está por perto, na mesma rua, quadra ou a poucos metros, o que pode aproximar as pessoas, em vez de enquadrá-las apenas no universo da amizade virtual. Podemos dizer que o WeChat é uma combinação de WhatsApp, Tinder, PayPal e diversos outros.

E, acredite, essas diferenças estão atreladas ao perfil daqueles que colocam dinheiro para o negócio funcionar. Os investidores de venture capital latinos frequentemente pressionam as startups para terem um fluxo de caixa positivo o mais rápido possível, por isso, elas são focadas em melhorar constantemente a interface e a usabilidade para conseguir se estabelecer em um mercado específico e alcançar esse tão almejado fluxo de caixa positivo. Por outro lado, os investidores chineses são bastante centrados no crescimento da base de usuários, pois acreditam que é ela que dará o retorno financeiro desejado ao negócio, o que faz muito sentido no gigante mercado chinês. Outra vantagem do mercado chinês em detrimento ao latino é que o país tem dinheiro e o acesso ao capital para empreender é muito mais fácil e menos burocrático.

Com tudo isso, eu diria que as oportunidades no mercado de internet latino são imensas, principalmente se considerarmos que, no primeiro trimestre de 2016, contamos com apenas 1% (algo em torno de US$ 300M)  do investimento de venture capital global, contra 25% na Ásia, sendo sua maioria na China. Fazemos muito com pouco. Também somos criativos e isso atrai a atenção dos chineses para as nossas ideias. Da nossa parte, podemos importar deles a possibilidade de incorporar mais funcionalidades aos apps e aproveitar melhor o investimento de risco que envolve as startups. Sem dúvida, são mercados que se complementam no que diz respeito ao desenvolvimento de aplicativos e merece atenção a troca dessas expertises. Se temos muito a aprender com os chineses, também temos muito a ensinar.

*Rafael Lauand é CEO da Vá de Táxi, empresa de chamada de táxi da Porto Seguro.

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